por Ruth Carolina R. Sgrignolli[1] e Walter Viera Ceneviva[2]

 **Artigo originalmente publicado na obra “Poder econômico e estado: concentração e poder econômico – Vol. I.

Introdução

A Constituição Federal determina no parágrafo 5º[3], do artigo 220 que os meios de comunicação social não podem ser objeto de monopólio ou oligopólio.

Ainda de acordo com a Constituição, os meios de comunicação social são diversos: jornais, rádio, televisão, internet, cada qual, com suas especificidades.

A importância dos meios de comunicação para o Estado democrático está diretamente relacionado ao exercício da comunicação da sociedade frente ao Estado[4]. O direito fundamental à informação, bem como a liberdade cidadã de expressão, exercem-se hoje por meio dos veículos de comunicação de massa[5].

Em pesquisa realizada pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), em 2011 sobre a experiência audiovisual, 78% dos entrevistados afirmaram assistir a televisão/ DVD todos os dias e 11% assistem várias vezes por semana. Somados, o conjunto de pessoas desses dois grupos representa que 89% dos entrevistados são praticantes intensivos ou habituais de televisão. Apenas 17,2% assistem pelo menos uma vez por mês e 3,6% raramente[6].

A tabela abaixo, compilada pela Empresa de Consultoria em Telecomunicações “Teleco”, com base nos dados apresentados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), indica o nível de penetração da televisão e do rádio nos domicílios brasileiros.

2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Rádio 88,9% 87,9% 81,4% 83,4% 80,9% 75,7% 72,1%
Televisão 95,0% 95,6% 95,0% 96,9% 97,2% 97,2% 97,1%
Domicílios* 58.181 59.253 57.324 62.117 63.768 65.130 67.039

*milhares de domicílios

– 2010 segundo Censo 2010

– 2001-2009/2011-2014 Os dados desta tabela foram reponderados pela revisão 2013 das projeções populacionais, incluindo a tendência 2000-2010

Fonte: PNAD (IBGE)

 

É clara, portanto, a importância da televisão como meio de informação.

Por isso, o objetivo desse trabalho é analisar, especificamente, como surge o meio de comunicação social radiodifusão de sons e imagens, quais os limites físicos, e aspectos econômicos responsáveis por moldar esse mercado e as normas correlatas.

1. A origem do meio de comunicação eletrônica

A comunicação, quando acontece entre as pessoas, em um mesmo ambiente, dá-se por meio de uma manifestação de ondas mecânicas do som, que são formadas por meio de um processo fisico-biológico, emitidas por um meio que é o “ar” até chegarem num receptáculo com uma estrutura fisico-biológica que permita o processamento daquele som e sua compreensão por outro ser.

A comunicação escrita, diferente da comunicação verbal, vale-se de símbolos gráficos combinados que resultam em mensagens inteligíveis entre duas ou mais pessoas.

Ambas as comunicações descritas são antigas e limitadas. O limite estende-se à distância e ao tempo que a mensagem pode levar para chegar ao interlocutor e ao conhecimento prévio que se tenha a respeito dos símbolos pelos quais a linguagem se manifesta.

Diferente dessas comunicações “mecânicas”, a comunicação eletrônica envolve elétrons (correntes elétricas) em um determinado meio (sistema ionizado da atmosfera)[7], ‘caminhando’ em uma determinada frequência (ou banda de frequência)[8].

A telegrafia foi o primeiro grande avanço da área da comunicação eletrônica[9]. Seguiu-se a ela, o telefone[10] e a radiotelegrafia que culminou com o trabalho de Guilhermo Marconi[11] sobre o desenvolvimento na transmissão de sinais e pulsos elétricos[12].Surge assim o rádio.

2. O surgimento do rádio e a “escolha” pelo modelo comercial

A primeira transmissão de rádio, no Brasil, aconteceu em sete de setembro de 1922, no alto do Corcovado, Rio de Janeiro. Em comemoração ao centenário da proclamação da República, a empresa “Westinghouse Eletric” instalou transmissores e alto-falantes ao longo da cidade para transmitir o discurso do presidente Epitácio Pessoa[13].

Interessante notar que todo equipamento para transmissão do rádio havia sido trazido pela empresa americana. O Brasil estava inserido em uma realidade econômica de dominação da elite cafeeira, que, embora dotada de espírito modernizador, não empolgou “os destinos da Nação como um todo”. A evolução para o século XX e o processo de industrialização que iria se desenrolar até a década de 30 fizeram parte da evolução interna de um capitalismo competitivo[14] [15].

A instalação da estação feita pela “Westinghouse Eletric” seria desmontada e inutilizada não fosse pelo professor Roquete Pinto, que, por meio da empresa Rádio Sociedade, recebeu em doação os equipamentos e manteve durante treze anos, a estação de rádio do Rio de Janeiro (Rádio Escola Municipal do Rio de Janeiro), funcionando com um conteúdo educativo até que devido à dificuldade financeira em alterar as características técnicas que requeriam a nova legislação[16], a rádio passou a ser administrada pelo Governo do Estado da Guanabara[17] (que, em 1975 fundiu-se com o Estado do Rio do janeiro).[18]

As primeiras emissoras instaladas no país eram emissoras com clube ou sociedade em seu nome e o prefixo PR. A exemplo disso, estava a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, a PRA-2. Também a Rádio Clube de Pernambuco, depois registrada como PRA-8; a Rádio Educadora Paulista, em São Paulo; enquanto cearenses organizaram a Ceará Rádio Clube. Posteriormente o Rio de Janeiro inaugurou sua segunda emissora – a Rádio Clube do Brasil – a PRA-3, diferente por ser comercial, e a primeira a requerer e ser formalmente autorizada a veicular anúncios[19].

As primeiras rádios emitiam sinais em ondas médias (AM), que possuíam grande alcance, atingindo cidades remotas e os interiores dos Estados. Apenas no início da década de setenta é que houve a implantação das ondas em frequência Modulada (FM), cuja qualidade do som era melhor, devido à menor interferência atmosférica, mas ela possuía alcance limitado. Com o tempo, as FMs iriam se tornar as rádios mais escutadas nos grandes centros, ao passo que as AMs seriam a opção das populações mais carentes e zona rural[20].

O surgimento das rádios no Brasil e no mundo gerou a necessidade de gerenciar e regular a utilização do espectro de radiofrequência.

O primeiro organismo internacional que surgiu com essa finalidade foi o “International Telegraph Union”, fundado em Paris, em 1.865[21]. Posteriormente, em 1934, passou a se chamar “International Telecommunication Union (ITU)”, a fim de abranger todas as atividades sob seu escopo, que iam desde a Comissão Internacional de Consulta do Telégrafo até a Comissão de Consulta de Rádio[22]. Até que, finalmente, em 1947, a ITU passou a ser uma agência especializada da Organização das Nações Unidas (ONU).

No Brasil, a regulamentação veio no governo de Getúlio Vargas, em 1932, quando foi promulgado o Decreto 21.111 que regulamentava a execução dos serviços de radiocomunicação[23] e que deixou o serviço sob a égide do Ministério de Estado dos Negócios da Viação e Obras Públicas[24].

Esse decreto rascunhou as primeiras características do modelo brasileiro de radiodifusão, que viriam a ser repetidos em regulamentos posteriores.

A radiodifusão foi definida como um serviço de sons ou imagens destinas a ser livremente recebida pelo público, cujo caráter era nacional e a finalidade· educativa e previa a preocupação em formar uma rede nacional de comunicação[25].

A competência para legislar sobre o tema era da União[26] e foi prevista a possibilidade da execução do serviço por terceiros, se houvesse conveniência e interesse para o país[27].

Nesse mesmo ato previu-se a existência de emissoras comerciais[28], o que a doutrina, mais tarde, passou a chamar de 11 trusteeship model”, modelo de gestão do espectro eletromagnético pelo qual o Estado permite a exploração comercial do espectro, por tempo determinado e sob condições específicas[29].

Assim, em 1937, havia, no Brasil, sessenta e três rádios. Apenas cinco delas eram de propriedade do governo[30]. As demais, eram comerciais. O início da década de 30 (trinta) condicionou o Brasil ao desenvolvimento do mercado interno, progresso tecnológico dos transportes e comunicações, aliás, o progresso industrial em geral, o que acabou por tornar acessível à massas consumidoras os mais variados artigos[31].

A expansão das atividades econômicas, nesse período, marcou o crescimento do mercado de consumo. Esse fato alavancou o investimento de patrocinadores e as rádios tomaram-se bem-sucedidas comercialmente, embora sua audiência fosse ainda restrita àqueles que podiam ter um aparelho de rádio.

No fim dos anos 30, a rádio comercial já recebia massivo aporte em publicidade, passando a disputar com os jornais essa fatia de remuneração[32] e indicando que ela havia se tornado um meio competitivo de comunicação:

Como ambas as soluções se mostraram impossíveis, ele passaram a disputar concessões para exploração do novo meio e a pressionar concessionários amadores a vender as concessões para interesses comerciais. Morrem então os rádio clubes, que são substituídos por empresas, muitas delas de propriedade dos mesmos grupos econômicos e políticos que controlavam os meios impressos.

Melviu L. DeFleur e Sandra Ball-Rokeach[33] explicam que, na Nova York dos anos 20, os homens do rádio se debatiam com a questão da forma adequada de sustentação financeira. Foi então que uma comissão de executivos teve a ideia de criar um fundo cujo dinheiro viesse diretamente dos ouvintes.

Embora entrasse um fiozinho de recursos, a maioria dos ouvintes decidiu que preferia ouvir o que quer que aparecesse em vez de pagar diretamente do próprio bolso para garantir a qualidade elevada nos programas. Tal resposta tipifica o sentimento da maioria ainda hoje. Também explica, em parte, porque o público acabou aceitando mensagens publicitárias como meio de financiar as irradiações. Preferiam antes suportar alguns comerciais discutíveis do que pagar diretamente por seu divertimento.

Importante notar que, mesmo com a promessa de concessão de regalias e favores garantidos às empresas nacionais que se dedicassem à técnica· radioelétrica sem fim comercial[34], nenhuma entidade ou órgão estatal teve interesse em prestar o serviço.

Possivelmente pela forma de organização do Estado da época, pouco industrializado, importador, que não possuía nenhuma instituição capaz desenvolver conhecimentos científicos e sem interesse na exploração direta do serviço, devido aos altos custos, é que o rádio comercial não foi propriamente uma escolha, mas o resultado de uma condição político-econômica[35].

Com o fim da guerra, a vinda dos imigrantes para o Brasil, o êxodo urbano e o desenvolvimento industrial[36], o rádio estava consolidado como veículo de comunicação. “Em 1940 elas eram 70, passaram a 243 em 1950, a 400 em 1960 e eram cerca de 1.000 em 1970”[37].

Em 2013 foi assinado o Decreto 8139 que extinguiu o serviço de radiodifusão sonora em ondas médias de caráter local e permitiu que as ondas médias em caráter regional ou nacional fossem adaptadas para executarem do serviço de radiodifusão sonora em frequência modulada (FM)[38].

Embora as rádios AM tenham representado um salto na evolução do sistema comunicacional Brasileiro, o crescimento das cidades acabou por inviabilizar esse serviço que sofre mais interferências eletromagnéticas, com comportamentos distintos durante o dia e com alta degradação imposta pelo ruído elétrico urbano[39].

A digitalização do sinal em FM possibilitou melhor aproveitamento do espectro de radiofrequência e a acomodação do sinal das AMs nessa nova faixa, cumpridos os requisitos da Portaria 6467/2015 SEI/MC.

3. O surgimento da televisão

Diferente do rádio, cuja invenção precedeu um longo período de descobertas científicas e envolveu pesquisas na melhoria de sua implantação, a televisão, quando foi comercializada (em 1939, nos Estados Unidos), já possuía tecnologia bem avançada. Além disso, o público já estava habituado com um formado de conteúdo de programação e inserções publicitárias[40].

No Brasil, Assis Chateaubriand, dono do maior conglomerado de comunicação do Brasil, na época (entre jornais, revistas e rádios), tinha voltado dos Estados Unidos:

“(…) dividido entre a campanha presidencial, a consolidação do Museu de Arte de São Paulo e a realização do velho sonho de implantar no Brasil a quarta rede de televisão do mundo (e a primeira na América Latina)”[41].

A televisão trazida por Chateaubriand, em princípio dos anos 50 (cinquenta) foi financiada por quatro dos maiores anunciantes dos Diários Associados:

Esse transmissor foi erguido, pois, com a prata da casa; isto é, com os recursos de publicidade que levantamos sobre a prata Wolf e outras não menos macias pratas da casa: a Sul América, que é o que pode haver de bem brasileiro; as lãs Sams, do Moinho Santista, arrancadas ao coro das ovelhas do Rio Grande e, mais que tudo isso, ao Guaraná Champanhe da Antártica, que é a bebida dos nossos selvagens, o cauim dos bugres do Pantanal mato-grossense e de trechos do vale amazônico[42].

Vivendo a euforia industrial brasileira impulsionada pelo então presidente Juscelino Kubitschek, a indústria eletrônica buscou desenvolver tecnologia própria, no Brasil, a fim de baratear o custo dos receptores de televisão. Isso feito, o aparelho passou a fazer parte da vida de mais brasileiros, alcançando também, os de baixa renda[43].

Em 1956, em São Paulo, as três emissoras de TV reunidas arrecadaram mais dinheiro publicitário que as treze emissoras de rádio paulistas juntas. A televisão começava a se estabelecer como veículo de comunicação de maior predileção para os anunciantes[44].

E entre 1951 a 1959 foram outorgadas todas as concessões para as televisões abertas (para a capital de São Paulo) conhecidas até hoje[45]:

a. Decreto nº 28.854, 13 de fevereiro de 1950, outorga concessão a Rádio Record S.A, com sede em São Paulo Estado de São Paulo para estabelecer uma estação de radiotelevisão.

b. Decreto nº 29 .238, de 29 de janeiro de 1951, prorroga, por 10 anos, a concessão outorgada à S. A. Rádio Tupi para estabelecer uma estação radiodifusora nesta Capital (mais tarde, Rede Globo).

c. Decreto nº 30.590, de 22 de fevereiro de 1952, outorga concessão à Rádio Televisão Paulista S.A., para estabelecer uma estação radiotelevisão na cidade de São Paulo, Estado de São Paulo.

d. Decreto nº 30.816, de 5 de maio de 1952, outorga concessão à Sociedade Cultura “A Voz do Espaço” para estabelecer uma estação. de radiotelevisão na cidade de São Paulo, capital do Estado de São Paulo (mais tarde, Fundação Padre Anchieta ou TV Cultura).

e. Decreto nº 45.047, de 12 de dezembro de 1958, outorga concessão à Rádio Bandeirantes Sociedade Anônima para instalar uma estação de radiotelevisão.

f. Decreto nº 45.283, de 26 de Janeiro de 1959, outorga concessão à Fundação Casper Líbero para estabelecer uma estação de radiotelevisão na cidade de São Paulo, Estado de São Paulo.

Saint-Clair Lopes, em 1957 disse:

Copiando modelos estrangeiros – notadamente os norte-americanos – a radiodifusão brasileira tomou o mesmo impulso violento, sem no entanto, estar alicerçada numa legislação conveniente. Os problemas cada vez mais se avolumam e a administração dificilmente poderá resolvê-los com o apoio legal[46].

E assim foi feito.

A primeira lei federal editada para reger as regras televisivas de modo sistêmico só aconteceu doze anos depois, da primeira televisão ir ao ar.

Para Pieranti, os empresários donos de meios de comunicação de massa, amparavam-se nos favores gerados no seio do Estado para consolidarem suas empresas. A relação de permissividade entre interesses público e privado estava fundada no financiamento de atividades por parte dos agentes públicos e nos empresários do setor, aos poucos, alcançaram cargos políticos importantes para a aprovação do Código Brasileiro de Telecomunicações[47].

A Lei 4.117, promulgada em 27 de agosto de 1962, instituiu o Código Brasileiro de Telecomunicações. Sua aprovação foi seguida de uma série de vetos, pelo Presidente João Goulart, os quais ampliaram o poder do Presidente da República sobre os concessionários de radiodifusão.

Com uma abordagem diferente de Pieranti, Ceneviva[48] cita o Parecer 94/0, do consultor-geral da República, Themístocles Cavalcanti, que ao decidir sobre renovação de outorga à Rádio Farroupilha, para operar a partir de Porto Alegre (RS), em 1945, determinou que “o governo deu, o governo tira”.

Por ato unilateral e lastreado numa alegação genérica de interesse público, o governo decreta a morte do empreendimento radiodifusor. Diz Themístocles Cavalcanti: ‘ (…) nos termos daquele contrato tinha o Governo (sic) a faculdade de renovar ou não a concessão, a seu juízo usando de um arbítrio que encontra seu apoio na lei (…) ‘.

O risco dos vetos do presidente estavam embasados justo nessa questão: o poder de “vida e morte” do Executivo[49] em relação às concessões de televisão.

Tais vetos foram integralmente rejeitados pelo Congresso Nacional.

A Lei 4.117/62, conhecida como Código Brasileiro de Telecomunicações, definiu o serviço de telecomunicações[50] como a transmissão, emissão ou recepção de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons[51] ou informações de qualquer natureza, por fio, rádio, eletricidade, meios óticos ou qualquer outro processo eletromagnético, sendo que a telefonia é o processo de telecomunicação destinado à transmissão da palavra falada ou de sons e a radiodifusão como o serviço destinado a ser recebido direta e livremente pelo público[52] em geral, compreendendo radiodifusão sonora e televisão[53].

A Lei 4.117/62 manteve a prerrogativa da União[54] explorar a prestação dos serviços e determinou se objetivasse as finalidades educativas e culturais inerentes à radiodifusão, visando aos superiores interesses do País[55] e a competência para organizar O serviço passou a ser do Conselho Nacional de Telecomunicações. Além disso, o Código previu as infrações e penalidades na prestação dos serviços de telecomunicações, vigentes até hoje.

4. Os limites às propriedades de emissoras de rádio e televisão

Foi com o Decreto 52.795, publicado no ano seguinte, em 1963, que o legislador se preocupou com a questão da propriedade dos meios de radiodifusão de sons e imagens. Com vistas a coibir a propriedade cruzada[56], determinou-se que, nas licitações, a mesma entidade ou as pessoas que integravam o seu quadro societário e diretivo não poderiam ser contempladas com mais de uma outorga do mesmo tipo de serviço de radiodifusão na mesma localidade.

O ‘Regulamento dos Serviços de Radiodifusão’ também classificou os serviços de radiodifusão[57], bem como detalhes de procedimento para obtenção de outorga e licença de funcionamento das estações[58], além de trazer as definições básicas do setor (como definição de Estação, Estúdio, Modulação).

O Decreto-lei 236/67 reescreveu a Lei 4.117/62 para alterar os artigos relativos à aplicação de penalidades ou ainda proibições e para trazer maiores especificações em relação à obtenção de concessões, permissões e autorizações por cada entidade, dentro do território nacional, regulando de maneira bastante restritiva e intervencionista o mercado televisivo.

O Decreto-lei 236/67 foi promulgado na vigência do Ato Institucional nº 4, durante o regime militar imposto em 1964[59].

O Decreto-lei definiu:

a. Nenhuma pessoa poderia participar da direção de mais de uma empresa de radiodifusão, em localidades diversas, em excesso aos limites estabelecidos[60].

b. As concessionárias ou permissionárias de serviço de radiodifusão não poderiam estar subordinadas a outras entidades que se constituíssem com a finalidade de estabelecer direção ou orientação única, através de cadeias ou associações de qualquer espécie[61]. Hoje, as redes de televisão são uma realidade reconhecida e tratada pelo artigo 32, parágrafo 16 da Lei 12.485/11 (Lei do SeAC)

c. Vedava a transferência direta ou indireta da outorga sem a prévia autorização do Governo Federal[62].

Como se vê, as restrições foram impostas às pessoas físicas, nacionais , que detivessem concessões e permissões de radiodifusão.

Em 1988 foi promulgada a Constituição Federal, que (i) manteve o serviço delegado (artigo 21, XII, ‘a’) e (ii) abriu um capítulo para tratar da Comunicação Social, definindo suas finalidades e impondo às televisões abertas restrição à entrada do capital estrangeiro (art. 222, CF), sem tratar especificamente da ‘concentração’ de outorgas a uma mesma pessoa (física ou jurídica) ou ainda da propriedade cruzada, cujas limitações nesse sentido, foram mantidas pelas normas impostas por lei ou decretos anteriores a promulgação da Constituição.

Em 28 de março de 2002 uma emenda à Constituição Federal (Emenda Constitucional de nº 36) determinou como se daria a participação de pessoas jurídicas no capital social de empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens, de forma que: (i) a propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens seria privativa de brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, ou de pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sede no País; (ii) pelo menos setenta por cento do capital total e do capital votante das empresas Jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens deveria pertencer direta ou indiretamente, a brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, que ficariam obrigados à gestão das atividades e a estabelecer o conteúdo da programação; (iii) a responsabilidade editorial e as atividades de seleção e direção da programação veiculada fora determinadas como privativas de brasileiros natos ou naturalizado há mais de dez anos, em qualquer meio de comunicação social, (iv) e que os meios de comunicação social eletrônica, independentemente da tecnologia utilizada para a prestação do serviço, também deveriam observar e garantir a prioridade de profissionais brasileiros na execução de produções nacionais.

Para regulamentar a participação de capital estrangeiro nas empresas, foi promulgada a Lei 10.610, em 20 de dezembro de 2002.

Por fim, a norma mais recente sobre a questão de propriedade no setor de telecomunicações, é a Lei nº 12.485, conhecida como Lei de Acesso Condicionado[63].

Nesse ponto é importante fazer a ressalva de que a Lei de Acesso Condicionado cuida do setor de telecomunicações (especificamente a televisão por assinatura), que possui diferenças significativas com o serviço de rádio e televisão aberta, que foram objeto desse artigo.

Não obstante, essa lei traz restrições à propriedade cruzada de ambos os setores: rádio e televisão aberta e telecomunicações.

Em observância às disposições constitucionais, a Lei de Acesso Condicionado estabeleceu, desde o princípio[64], que a comunicação audiovisual de acesso condicionado, em todas as suas atividades, fosse guiada pelos princípios (i) da liberdade de expressão e de acesso à informação; (ii) promoção da diversidade cultural e das fontes de informação, produção e programação; (iii) promoção da língua portuguesa e da cultura brasileira; (iv) estímulo à produção independente e regional; (v) estímulo ao desenvolvimento social e. econômico do País; e (vi) liberdade de iniciativa, mínima intervenção da administração pública e defesa da concorrência por meio da livre, justa e ampla competição e da vedação ao monopólio e oligopólio nas atividades de comunicação audiovisual de acesso condicionado.

Para tanto, considerou atividades da comunicação audiovisual de acesso condicionado a produção, programação, empacotamento e distribuição da programação audiovisual (art. 4° da Lei 12.485/11), buscando alterar, dessa forma, a verticalização da cadeia produtiva do setor.

A Lei também limitou as regras de propriedade cruzada, a fim de inviabilizar que produtora de conteúdo, empresa de telecomunicação e empresa de comunicação possam, de alguma forma, formar grupo econômico.

Conclusão

Conforme pode se observar, a formação do setor de radiodifusão de sons e imagens, no Brasil, à partir de 1922, deu-se, como em todo mundo, de uma fornia experimental, sem que houvesse projeto de implantação ou mesmo projeto para o setor em si.

Entre tantas análises que resultam das informações trazidas, três aspectos merecem destaque:

  1. A ausência de política pública de desenvolvimento do Estado, especialmente no que tange aos serviços de comunicação, que não lançou projeto de fomento de indústria audiovisual[65].
  2. O custo na implantação do sistema de irradiação, que em princípio era local e depois passa’ a operar em cadeia nacional[66]. Além do custo da produção dos conteúdos[67]. Em ambos os casos não houve financiamento estatal para implementação de infraestrutura que viabilizasse uma organização do setor menos monopolizada pelos “donos do dinheiro”.
  3. A legislação do setor. Importa observar que, desde a primeira norma a que se faz destaque (Decreto nº 21.111/32) houve a previsão da delegação do serviço[68]. Mesmo porque, no momento inicial de implantação de rádio e da televisão, o serviço foi prestado em âmbito local, por particulares para atender a demanda de notícias, entretenimento e cultura. Ao longo dos anos seguintes, as leis (bem como previsões constitucionais) evoluíram no sentido de eliminar o arbítrio e estabelecer licitações para outorga de concessões de rádio e televisão, submeter tal outorga à homologação pelo Congresso Nacional[69]; de garantir a liberdade de expressão e comunicação[70] e vetar o monopólio[71] desse setor.

Não há muito que se possa fazer em relação às políticas públicas iniciais de implementação do serviço. Mas o que se verifica é que os serviços de televisão, cuja importância para o país é indiscutida, têm sido objeto de atenção constitucional e legislativa, depois de sua implementação prática.

Deixar a cargo do Estado a propriedade do setor de comunicação pode representar a eliminação de uma arma fundamental contra sua atuação, ao menos em democracias jovens, como é o caso do Brasil[72].

A televisão é hoje segregada em televisão aberta, gratuita, acessível a todos e televisão paga, pela qual os respectivos telespectadores celebram contratos de aquisição onerosa do direito de ver televisão.

Conforme demonstrado incialmente; a televisão está em 97,1 % dos lares, sendo recebida gratuitamente. Esse modelo de negócio, com essa dimensão, só existe no Brasil, onde a televisão aberta[73] é a mais assistida e é gratuita. Todavia, o custo de manutenção dessa estrutura é alto.

Por apresentar essas características, a produção de bens midiáticos incorre em economias de escala e de escopo. Isso porque, dados os atributos de bem público deste tipo de produto, o recurso despendido em produzir e/ou adquirir conteúdo, assim como em elaborar a grade ·de programação de um dado canal é pouco ou nada afetado pela audiência que o canal obtiver. Desta forma, as economias de escala decorrem da combinação de elevados custos fixos iniciais de produção e reduzido (ou nulo) custo marginal, tendendo a ser inferior ao custo ‘médio. Como consequência, ao aumentar a quantidade ofertada, o custo médio decai e o lucro é maior até o ponto em que o nível ótimo de produção é atingido[74].

Essa equação é difícil de resolver e demanda estudos econômicos que possibilitem às partes atuantes no setor, a remuneração pelo investimento e garantia de lucro, no final do mês.

Além disso, há um limite na possibilidade de investimento de capital na propriedade das empresas concessionárias de radiodifusão e, nesse caso, também a mídia impressa[75] (no mínimo 70% de seu capital votante e de seu capital total devem ser detidos por brasileiros natos, ou naturalizados há mais de dez anos).

E há limite ainda na organização de parte de sua programação, que deve observar parâmetros mínimos impostos pela Constituição e pela Lei.

 

Tabela 01: Emissoras de TV e afiliadas

Redes Próprias Afiliadas Total
Globo 16 76 92
SBT 9 40 49
Record 5 25 30
Bandeirantes 8 19 27
Rede TV 5 8 13
TV Cultura 1 12 13

Fonte: Anatel e teleco

Os dados da tabela acima indicam as televisões abertas e suas afiliadas, mas é notório que muitos desses grupos possuem ainda outros meios de comunicação, meios impressos (jornais e revistas) e eletrônicos (internet), além de serem produtoras de conteúdo. Ou seja, há um domínio na cadeia de produção e veiculação de conteúdo.

A simples determinação para que esses grupos abram mão de suas empresas pode ser considerado ingênuo.

A verdade é que em um mercado de altos custos como o da comunicação, apenas estruturas que atinjam grande número de usuários, atendendo a demanda do anunciante, podem vicejar.

Em um e em outro caso, por mais diferentes que sejam os conteúdos culturais, há concentração da indústria cultural. A imprensa, o rádio, a televisão, o cinema são indústrias ultraligeiras. (…) Entretanto, essa indústria ultraligeira está organizada segundo o modelo da indústria de maior concentração técnica e econômica. No quadro privado, alguns grandes grupos de imprensa, algumas grandes cadeias de rádio e televisão, algumas sociedades cinematográficas concentram em seu poder o aparelhamento (rotativas, estúdio) e dominam a comunicação de massa. No quadro público, é o Estado que assegura a concentração.[76]

O fim do monopólio ou do oligopólio em uma estrutura historicamente inviável em termos de custo, só é possível por meio da observância de melhor distribuição de renda publicitária, em mecanismos de controle de condutas anticompetitivas (Lei 12.529/11).

E ainda por meio da entrega diversificada do conteúdo do gosto do telespectador, “seguindo a cultura de massa, no seu perpétuo movimento de técnica à alma humana”[77].

A professora Ana Maria Fadul[78], em artigo “Indústria Cultural e Comunicação de Massa” analisa o papel do rádio e da televisão, como. instrumentos da propaganda de guerra fascista e nazista, passando pela questão do domínio cultural americano, analisado por Adorno, Horkheimer e Marcus e no pós-guerra e a representação desses meios hoje, em culturas diversas. A importância do texto remete à um pensamento proposto nesse artigo:

Minha proposta é superar a dicotomia Escola-Meios de Comunicação de Massa, Escola Indústria Cultural, porque os meios de comunicação de massa não são os únicos inimigos das classes trabalhadoras e da sociedade brasileira. Eles reforçam unia dominação que começa na fábrica, no escritório, na Escola, na família, na Universidade.

Eles são coadjuvantes importantes, mas são coadjuvantes. A dominação já existe na sociedade, mas eles são realmente um esforço e um impulso muito grandes. Portanto, meu convite é para que, a Escola aprenda a decifrar esses meios e a colocá-los a serviço de uma outra educação e de uma outra televisão. É preciso educar os alunos para não aceitarem esta televisão que aí está, porque esta não é a televisão. Mas é preciso antes estudar e conhecer os meios de comunicação de massa.

Esse estado de coisas propõem um desafio ao país, particularmente difícil de vencer, que é acomodar a questão dos investimentos para que os meios de comunicação atendam à finalidade mais importante a que se destinam: informar. E essa acomodação entre financiamento dos veículos de comunicação e garantia de uma mídia plural, sem maniqueísmos em relação aos meios pelos quais se informa é o segredo de uma democracia bem-sucedida.

 

**In: Arthur Bezerra de Souza Junior e Felipe Asensi. (Org.). Poder econômico e estado: concentração e poder econômico. Rio de Janeiro: Ágora21, 2018, v. 1, p. 55-87.

 

 

 

 

[1] Advogada especializada em Direito Empresarial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mestre e Doutoranda em Direito Político e Econômico pela mesma Universidade. É professora convidada do Curso de Pós-Graduação de Propriedade Intelectual, Direito do Entretenimento e Mídia da Escola Superior da Advocacia e professora de Ensino à Distância do Curso de Pós-Graduação de Direito e Processo do Trabalho da Universidade Presbiteriana Mackenzie, além de pesquisadora do grupo de Estado e Economia no Brasil da mesma Universidade. É membro efetivo da Comissão de Ciência e Tecnologia e da Comissão para Liberdade de Imprensa, ambas da OAB- SP.

[2] Advogado, professor convidado da Escola Superior de Advocacia OAB no Curso de Pós-Graduação de Propriedade Intelectual, Direito do Entretenimento e Mídia. Foi coordenador, pelo IPEJUR – Instituto de Pesquisas Jurídicas, do Curso de Especialização em Direito das Telecomunicações da Universidade da Cidade, em São Paulo. Foi membro do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional, nas legislaturas de 2013/2014 e de 2015/2017. É o presidente da Comissão de Liberdade de Imprensa da OAB/SP.

[3] Constituição Federal: “Art. 220 () § 5º Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio.”

[4] Nesse sentido, vale citar o voto do Ministro Ayres Britto, em decisão de Referendo na Medida Cautelar na ADI/DF 4.451 que suspendeu as normas do inciso II e da segunda parte do inciso III, ambos do artigo 45 da Lei 9.504 de 30/9/97, bem como, por arrastamento, dos §§ 4º e 5º do mesmo artigo da referida Lei. Esse é o caso dos programas humorísticos que foram alvo de regra limitadora durante período eleitoral, assim se pronunciou o Ministro: “A Magna Carta Republicana destinou a imprensa o direito de controlar e revelar as coisas respeitantes à vida do Estado e da própria sociedade. A imprensa como a mais avançada sentinela das liberdades públicas, como alternativa à explicação ou versão estatal de tudo que possa repercutir no seio da sociedade e como garantido espaço, de irrupção do pensamento crítico em qualquer situação ou contingência.

[5] Para suspender as normas do inciso II e da segunda parte do inciso III, ambos do artigo 45, bem como, por arrastamento, dos §§ 4º e 5º do mesmo artigo da Lei federal nº 9.504, de 30/9/97. Caso dos programas humorísticos que foram alvo de regra limitadora durante período eleitoral. COMPARATO, Fabio Konder. A democratização dos meios de comunicação de massa. REVISTA DA USP, São Paulo, n. 48, dez./fev.2000/2001, p.16.

[6] Disponível em: http://www.ipea.gov.br/agencia/images/stories/PDFs/politicas_sociais/bps_ 19 completo.pdf, acesso em 29/10/2017.

[7] Considerando-se aqui a comunicação eletrônica de rádio e televisão. Mas a comunicação eletrônica também pode se dar por outro meio, ou seja, através de fibra, como é o caso da telefonia fixa e transmissão de dados via cabo.

[8] Disponível em: http://professor.ufabc.edu.br/marcio.eisencraft/ Artigos/PropagacaodeSinais.pdf, acesso em 28/10/2016.

[9] De acordo com Asa Briggs e Peter Burke: “O desenvolvimento do telégrafo estava intimamente associado ao desenvolvimento das ferrovias-métodos instantâneos de sinalização eram necessários, por motivo de segurança em linhas simples (…)”, em Uma história Social da Mídia, Rio de Janeiro: Zahar, 2006, p. 137.

[10] Alexandre Graham Bell patenteou o telefone em 1876. Interessante notar que em 1899 a At&T tornou-se a principal empresa do serviço de telefonia. Ela era, em 1885, uma subsidiária da rede de longa distância National Bell (Asa Briggs e Peter Burke, Uma história Social da Mídia, Rio de Janeiro: Zahar, 2006, p. 153).

[11] Pedido de Patente de Guillermo Marconi, disponível em: https://worldwide.espacenet.com/publicationDetailsfbiblio?FT=D&date=18970702&DB=&locale=en_EP&CC=GB&NR=189612039A&KC=A&ND=1, acesso em 28/10/2016. Existe uma discussão, no Brasil, acerca de que um padre gaúcho, chamado Roberto Landell de Moura teria obtido êxito na transmissão de voz em rede sem fio, em 1892, ou seja, quatro anos antes do Marconi. Todavia, Landell não teria conseguido registrar a patente do invento de modo a se tornar o primeiro cientista a irradiar o sinal (disponível em: http://www2. camara.leg.br/camaranoticias/radio/materias/REPORTAGEM-ESPECIAL/404135-MEMORIA-DO-RADIO:-OS-PIONEIROS–NO-BRASIL-E-NO-MUNDO-BLOCO-1.html, acesso em 10/10/2016).

[12] O final do século XIX, como se sabe, foi rico em grandes descobertas. A existência do rádio e da televisão, que são os meios de comunicação objeto desse trabalho, não seria possível sem que antes se outros cientistas fizessem descobertas que culminariam com a possibilidade da transmissão de voz e imagens a distância. A exemplo, citam-se: Benjamin Franklin (transmissão elétrica, 1867), Michel Faraday (eletroquímica, 1831), André-Marie Ampere (corrente elétrica, galvômetro, telégrafo elétrico, 1825),James Watt (máquina à vapor e potência, 1790), James Clerk Maxwell (termodinâmica, 1870), Tomas Edson (lâmpada elétrica, 1879), Heinrich Hetz (propagação de ondas, 1887) entre tanto outros.

[13] A transmissão experimentai teve, além do discurso do presidente, música clássica – incluindo a ópera ‘”O Guarani”, de Carlos Gomes, durante toda a abertura da exposição. Disponível em: http://memoria.ebc.com.br/agenciabrasil/agenciabrasil/noticia/2012-09-07/primeira-transmissao-de-radio-no-brasil-completa-90-anos, acesso em 10/10/2016.

[14] FERNANDES, Florestan, A revolução burguesa no Brasil, 2ª edição, Rio de Janeiro: Zahar, 1976, p. 206 e 207.

[15] A primeira indústria eletrônica a surgir no Brasil, com capital majoritariamente nacional aconteceu em 1926: a Rádio Industrial Brasileira, de propriedade do advogado paulista Eugênio Lefevre, que fazia receptores radiofônicos, chegou a fazer rádios de válvula e transmissores. Mas as dificuldades agravadas pela crise de 1929 provocaram o fechamento da empresa em 1930 conforme, HERTZ, Daniel Koslowsky, História da radiodifusão no Brasil, trabalho de dissertação apresentado no curso de Comunicação Social e Habilitação em jornalismo, São Leopoldo, 1977, p. 34.

[16] Durante seus 13 anos de existência, a emissora manteve uma programação eminentemente “cultural”, e, demonstrando que cultura também “educa”, “ensinou” poesia, literatura e ciência, “educou” ouvidos para a música de concerto e “deu as primeiras aulas” de pronúncia padrão brasileira ‘da língua portuguesa. Ninguém tem dúvida de que o rádio brasileiro foi um dos principais responsáveis pela unificação linguística do· país, mas nem todos sabem que a coisa começou com a Rádio Sociedade. Disponível em: http://ww.radioroquettepinto.rj.gov.br/index.php/controladorhistorico, acesso em 28/10/2016.

[17] Disponível em: http://www.radiorj.com.br/am0630.html, acesso em 27/12/2017.

[18] Hoje, Rádio MEC AM 800.

[19] Disponível em: http://www.al.sp.gov.br/noticia/?id=270030, 29/10/2017 e http://www.abert.org.br/web/index.php/quemsomos/historia-do-radio-no-brasil, acesso em  29/10/2017.

[20] TOME, Takashi, CASTRO, Cosette e FILHO, André Barbosa (orgs.) Mídias Digitais, convergência tecnológica e inclusão digital, JÚNIOR, Humberto Abdala, RAMOS, Murilo César, Edgar Roquette Pinto: o que ele tem a ver com o rádio digital, São Paulo: Paulinas, 2005, p. 126.

[21] Disponível em: https://www.itu.int/en/history/Pages/ITUsHistory.aspx, acesso em 29/10/2017.

[22] Disponível em: https://www.itu.int/en/history/Pages/ITUsHistory-page-3.aspx, acesso em 29/10/2017.

[23] Antes desse período, houve o Decreto n. 16.657 /24 que tratava sobre radiotelegrafia e radiotelefonia.

[24] Em 1º de março de 1932 foi aprovado o regulamento para a execução dos serviços de radiocomunicação no território nacional, por meio do Decreto n. 21.111.

[25] Decreto 21.111/32: “Radiodifusão, radiocomunicação de sons ou imagens destinas a ser livremente recebida pelo público; ( ) Art. 11. O serviço de radiodifusão é considerado de interesse nacional e de finalidade educacional. § 1 º O Governo Federal promoverá a unificação dos serviços de radiodifusão, tendo em vista estabelecer uma rede nacional que atenda aos objetivos desses serviços.

[26] Decreto 21.111/32: “Art. 4º São da exclusiva competência da União os serviços de radiocomunicação no território, nas águas territoriais e no espaço aéreo nacionais, ficando sob sua imediata dependência toda e qualquer legislação sobre os mesmos serviços”.

[27] Decreto 21.111/32: “Art. 5º A par dos serviços de radiocomunicação de caráter público, administrativo e militar, executados exclusivamente pela União, poderá admitir o Governo Federal, se houver conveniência e interesse para o país, a execução, por terceiros, de outros serviços que lhe não forem privativos, desde que sejam estritamente observadas e satisfeitas às exigências estabelecidas neste regulamento e as disposições das convenções e regulamentos internacionais ratificados pelo Governo do Brasil e aplicáveis à material”.

[28] Decreto 21.111/32: “Art. 73. Durante a execução dos programas é permitida a propaganda comercial, por meio de dissertações proferidas de maneira concisa, clara e, conveniente à apreciação dos ouvintes, observadas as seguintes condições: a) o· tempo destinado ao conjunto dessas dissertações não poderá ser superior a dez por cento (10%) do tempo total de irradiação de cada programa; b) cada dissertação durará, no máximo, trinta (30) segundos; c) as dissertações deverão ser intercaladas nos programas, de sorte a não se sucederem imediatamente; d) não será permitida, na execução dessas dissertações, a reiteração de palavras ou conceitos.”

[29]Nesse sentido, LIMA, Venício Arthur de., Regulação das comunicações: história, poder, direitos, São Paulo: Paulus, 2011, p. 28 e JAMBEIRO, Othon, A TV do Brasil 110 século XXI, Salvador: EDUFBA, 2001, p. 46.

[30] Conforme dados do IBGE de 1937. Disponível em: http://seculoxx.ibge.gov.br/images/seculoxx/arquivos_download/cultura/1938/cultura1938_aeb29 _a_30.pdf, acesso em 29/10/2017.

[31] JÚNIOR, Caio Prado, História Econômica do Brasil, 2ª reimpressão da 43ª edição, Brasília: Brasiliense, 2014, p. 289.

[32] Othon Jambeiro relata, em seu trabalho que: “Entre 1928 e 1935 vieram para o Brasil várias agências de publicidade americanas, entre as quais algumas das maiores do mundo: Walter Thompson, McCann Erickson, Lintas e Standard. Vieram acompanhando investimentos industriais de empresas transnacionais para quem já trabalhavam no exterior. Essas agências tiveram um importante papel no desenvolvimento da radiodifusão no Brasil, particularmente porque foram elas que passaram a desviar verbas de propaganda de jornais e revistas para aplicação no rádio. Mais que isso, na verdade essas agencias estrangeiras tiveram decisivo papel na elaboração e sedimentação de uma economia para o rádio: assim como já vinham fazendo com os jornais e revistas, elas capturavam e distribuíam verbas publicitárias para o rádio, produziam ou ajudavam a produzir programas voltados para as novas massas consumidoras e assim moldaram a radiodifusão brasileira à imagem do modelo americano”. Opus cit., pg. 46 e 27.

[33] DEFLEUR, Melvin L., BALL-ROKEACH, Sandra, Teorias da Comunicação de massa, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1993, p. 121.

[34] Decreto 21.111/32: “Art. 106. As sociedades ou ligas nacionais, com personalidade jurídica, que se dedicarem à técnica radioelétrica sem fim comercial, poderá o Governo conceder atribuições, favores e regalias oficiais”.

[35] HERZ, opus cit., p. 17 a 20.

[36] SODRÉ, Muniz, O monopólio da fala, 8ª edição, Petrópolis: Vozes, 2010, p. 86 e 87.

[37] JAMBEIRO, opus cit., p. 49.

[38] Disponível em: https://sistemaplug:com.br/adm/pdf7664f71356076419e6af.3f81c24a6ba8c.pdf, acesso em 27/12/2017.

[39] Disponível em: http://www.set.org.br/set-news/entenda-a-migracao-do-radio-am-para-o-fmj, e https://www12.senado.leg. br/noticias/materias/2016/02/15/emissoras-de-radio-comecam-a-migrar-de-am-para-fm-no-final-do-mes, acesso em 27/12/2017.

[40] DEFLEUR, opus cit., p. 127 e 128.

[41] MORAES, Fernando, Chatô o rei do Brasil, São Paulo: Companhia das Letras, 1994, pg. 496.

[42] RIBEIRO, Ana Paula, SACRAMENTO, Igor, ROXO, Marco, História da Televisão no Brasil, do início aos dias de hoje, São Paulo: Contexto, 2010, p. 18.

[43] AMORIM, Edgar de Souza, História da TV Brasileira, Cadernos de Pesquisa, São Paulo: Centro Cultural, 2008, pgs. 10 a 12.

[44] Idem, ibidem.

[45] Todas renováveis por período de 15 anos, indefinitivamente.

[46] LOPEZ, Saint-Claire, Fundamentos jurídicos-sociais da radiodifusão, 1ª edição, Rio de Janeiro: Nacional de Direito, 1957, pg. 11.

[47] PIERANTI, Octavio Penna, MARTINS, Paulo Emílio M., O Código Brasileiro de Telecomunicações e a· Política de Expansão da Radiodifusão: a Ação do Empresariado como Grupo de Pressão, Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, XXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – UnB – 6 a 9 de setembro de 2006, p. 5, disponível em: http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2006/resumos/R1071-1.pdf, acesso em 10/10/2017.

[48] CENEVIVA, Walter Vieira, em artigo para Observatório da Imprensa, disponível em: http://observatoriodaimprensa.com.br/ feitos-desfeitas/marco-regulatorio-contra-o-arbitrio/, acesso em 30/10/2017.

[49] O Decreto 21.111/32 trazia em seu bojo a possibilidade de o “Governo” conceder e retirar o direto de exploração de uso de radiofrequência. A exemplo: “Art. 12. Por motivo de ordem ou segurança pública, de guerra ou ameaça de guerra, ou ainda para preservar a neutralidade do Brasil, poderá o Governo Federal suspender, em qualquer tempo e por prazo indeterminado, sem que assista às concessionárias ou aos permissionários direito a qualquer indenização, a execução dos serviços de radiocomunicação no território nacional, ou o funcionamento de todas as estações em determinada região do país, bem como proibir ou limitar a fabricação, apropriação, posse ou venda de quaisquer aparelhos de radiocomunicação, sendo-lhe também facultado remover ou manter no local, sob .a sua guarda, os aparelhos e demais acessórios das estações cujos serviços houverem sido por ele suspensos.” e “Art. 47. O Governo reserva-se, a todo tempo, a faculdade de restringir o emprego de frequências, tendo em vista evitar interferências e tirar o melhor proveito das que já tenham sido consignadas”.

[50] Essa definição foi considerada atual, pelo Ministro Relator Celso Melo, em seu voto, na ADI 561/2001, publicado no DJU em 23/03/2001, proposta pelo Partido dos Trabalhadores em face do Presidente da República, “Tenho para mim, presentes essas considerações, que a noção conceituai de telecomunicações – não obstante os sensíveis progressos de ordem tecnológica registrados nesse setor constitucionalmente monopolizados pela União Federal – ainda subsiste com o mesmo perfil e idêntico conteúdo, abrangendo, em consequência, todos os processos, formas e sistemas que possibilitam a transmissão, emissão ou recepção de símbolos, caracteres, sinais escritos, imagens, sons e informações de qualquer natureza. Em uma palavra: o conceito técnico-jurídico de serviços de telecomunicações não se alterou com o advento da nova ordem constitucional.”(pg. 88).

[51] Artigo 42 da Lei 4117/62.

[52] Diferente do sistema public service, disseminado na Europa ocidental e em algumas ex-colônias europeias, compreende variações mas substancialmente pensa sobre si mesmo como tendo um só objetivo: dar ao público não o que ele quer mas o que ele necessita, como concebido no interior do próprio aparato do sistema. Tendo como mote educar, entreter, informar, seu suporte financeiro é composto por compulsória contribuição da audiência geral do meio (a license fee na Inglaterra, por exemplo, é paga anualmente por cada residência que possua aparelho de TV, e custa o equivalente a 120 dólares, aproximadamente), fundos públicos e, em alguns casos, publicidade.

[53] Artigo 6º, ‘d’ da Lei 4117/62.

[54] Conforme Constituição Federal de 1946, “Art. 5º – Compete à União () XII – explorar, diretamente ou mediante autorização ou concessão, os serviços de telégrafos, de radiocomunicação, de radiodifusão, de telefones interestaduais e internacionais, de navegação aérea e de vias férreas que liguem portos marítimos a fronteiras nacionais ou transponham os limites de um Estado·”

[55] Artigo 38, ‘d’ da Lei 4117/62.

[56] Artigo 14 do Decreto 52.795/63.

[57] Artigo 4º do Decreto 52.795/63.

[58]Artigo 6º, 10º e seguintes do Decreto 52.795/63.

[59] ATO INSTITUCIONAL Nº 4. “CONSIDERANDO que a Constituição Federal de 1946, além de haver recebido numerosas emendas, já não atende às exigências nacionais; CONSIDERANDO que se tornou imperioso dar ao País uma Constituição que, além de uniforme e harmônica, represente a institucionalização dos ideais e princípios da Revolução; CONSIDERANDO que somente uma nova Constituição poderá assegurar a continuidade da obra revolucionária; CONSIDERANDO que ao atual Congresso Nacional, que fez a legislação ordinária da Revolução, deve caber também a elaboração da lei constitucional do movimento de 31 de março de 1964; CONSIDERANDO que o Governo continua a deter os poderes que lhe foram conferidos pela Revolução; O Presidente da República resolve editar o seguinte Ato Institucional nº 4: (…) Art. 9º – O Presidente da República, na forma do art. 30 do Ato institucional nº 2, de 27 de outubro de 1965, poderá baixar Atos Complementares, bem como decretos-leis sobre matéria de segurança nacional até 15 de março de 1967. § 1º – Durante o período de convocação extraordinária, o Presidente da República também poderá baixar decretos-leis sobre matéria financeira. § 2º – Finda a convocação extraordinária e até a reunião ordinária do Congresso Nacional, o Presidente da República poderá expedir decretos com força de lei sobre matéria administrativa e financeira.”

[60] § 5º do artigo 12 do Decreto 236/67.

[61] § 7º do artigo 12 do Decreto 236/67.

[62] § 6º do artigo 12 do Decreto 236/67.

[63] A Lei 12.485/11 alterou ainda Medida Provisória n. 2.228-1 (Lei da Ancine) de 6 de setembro de 2001, e Leis nrs. 11.437 (Lei do Condecine), de 28 de dezembro de 2006, 5.070, de 7 de julho de 1966 (Lei do Funttel).

[64] Artigo 3º da Lei 12.485/11.

[65] Como os americanos fizeram na década de 30/40, com a presença dos judeus na indústria de Hollywood, em MORIN, opus cit., p. 13.

[66] “Dez anos depois de sua fundação, o veículo mostrou-se um investimento de porte nacional”. disponível em: http://www.centrocultural.sp.gov.br/cadernos/ ligh tbox/light box/ pdfs/ Historia %20da%20TV%20brasileira.pdf, acesso em 30/10/2017.

[67] “O pilar de sustentação da programação televisiva continuou a ser o econômico. Tem-se que conseguir audiência a qualquer custo para obter O lucro financeiro. Isso faz, com raras exceções, que continuem a ser exibidos no vídeo das emissoras comerciais, programas de qualidade cultural muito baixa. Mesmo a telenovela, a produção mais cara do veículo, embora com encenação sempre melhor, apresenta textos incoerentes, incompatíveis com a realidade, em busca de sensacionalismos que aumentem a audiência.”, disponível em: http://www.centrocultural.sp.gov.br/cadernos/lightbox/lightbox/pdfs/Historia%20da%20TV%20brasileira.pdf,acesso em 30/10/2017.

[68] Observa-se, ainda que tardiamente, que tanto o rádio quanto a televisão nasceram sob a égide de regimes democráticos, mas que logo se tornaram ditaduras. Portanto, existe disposições claras no sentido da utilização do meio de informação a serviço do governo (destaque-se a obrigatoriedade da transmissão da voz do Brasil, flexibilizada recentemente pelo STF, em ARE 911445), bem como a possibilidade de limitação do conteúdo audiovisual a ir ao ar. Deixou-se de abordar esse tema ao longo do texto, uma vez que o objetivo do artigo é outro e tratar de assunto tão delicado demandaria por si só um novo artigo.

[69] Constituição Federal de 1988: “Art. 223. Compete ao Poder Executivo outorgar e· renovar concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens, observado o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal. § 1º O Congresso Nacional apreciará o ato no prazo do art. 64, § 2º e§ 4º, a contar do recebimento da mensagem. § 2º A não renovação da concessão ou permissão dependerá de aprovação de, no mínimo, dois quintos do Congresso Nacional, em votação nominal. § 3º O ato de outorga ou renovação somente produzirá efeitos legais após deliberação do Congresso Nacional, na forma dos parágrafos anteriores.

[70] Constituição Federal de 1988: “Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. § 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV”.

[71] Constituição Federal de 1988: “Art. 220 (…) § 5º Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio”.

[72] Sobre o tema, vide Francisco Fonseca, disponível em: http://www.scielo. br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-33522011000200003, acesso em 30/10/2017.

[73] De acordo com Estudo realizado pela Anatel em 2007, 99% dos lares norte-americanos possuem TV a cabo (paga). Na França, dos 29 canais digitais, onze são pagos. Disponível em: http://www.anatel.gov.br/Porta/verificaDocumentos/documento.asp?numeroPublicacao=207307&a, acesso em 30/10/2017.

[74] Conforme relatório da Ancine. Disponível em: http://www.icabrasil.org/2016/files/557-corporateTwo/downloads/EstudoTVAberta_versao_publicacao.pdf, acesso em 30/10/2017.

[75] Constituição Federal: Art. 222. A propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens é privativa de brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, ou de pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sede no País.

[76] MORIN, Edgar, Cultura de massas no século XX, 10ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2011, pg. 14.

[77] MORIN, opus cit., p. 11.

[78] Disponível em: http://www.crmariocovas.sp.gov.br/pdf7c_ideias_17_053_a_059.pdf, acesso em 27/12/2017.